sábado, 28 de outubro de 2017

Ramos e Fronteiras do Direito Administrativo

   O Direito Administrativo é definido por Diogo Freitas do Amaral como “o ramo do direito público cujas normas e princípios regulam a organização e funcionamento da Administração Pública em sentido amplo, a sua normal atividade de gestão pública e, ainda, os termos e limites da sua atividade de gestão privada.” Analogamente, Mário Aroso de Almeida define-o como “o ramo de Direito que disciplina, por um lado, a organização da Administração Pública, e por outro lado, o quadro das relações jurídicas que se estabelecem no âmbito do exercício da função administrativa, as chamadas relações jurídicas administrativas.”

   Por conseguinte, este setor do direito público articula-se com os demais ramos do direito, exercendo influências recíprocas.


Ramos do Direito Administrativo

   Afonso Rodrigues Queiró define ramo de direito como uma “fração da ordem jurídica total, diferenciada das outras frações por uma determinada exigência de ordem sistemática, de oportunidade ou de ordem didática”.

   O Direito Administrativo aquando do seu nascimento, em França, começou por ser considerado como um conjunto de exceções aos princípios e às regras do direito privado, só posteriormente passando a ser estimado como um corpo normativo autónomo, dotado de princípios e regras próprias. Não há dúvidas quanto ao facto de este ser parte do direito público, mas não pode ser considerado com uma subdivisão do direito público uniforme. Na verdade, devido à sua complexidade, à diversificação crescente da administração pública, e à sua infiltração na multiplicidade de interstícios do tecido social, contém ramos, nomeadamente:

- Direito Administrativo geral
- Direito Administrativo especial

   No Direito Administrativo geral, também conhecido como Direito Administrativo comum, é possível encontrar: as suas normas fundamentais, os conceitos basilares, os princípios gerais, as regras genéricas aplicáveis a uma pluralidade de situações, independentemente das suas caraterísticas particulares ou específicas. Traduz-se nos princípios e regras aplicáveis à atividade administrativa pública em geral, estando parcialmente codificado no Código de Procedimento Administrativo.

   Por seu turno, o Direito Administrativo especial abrange as normas que incidem sobre cada um dos setores específicos da administração pública. Dentro deste contam-se diversos ramos:

- O Direito Administrativo Militar
Este ocupa-se da organização das Forças Armadas, do regime jurídico da defesa nacional, dos deveres e encargos impostos por razões de defesa nacional aos cidadãos e das regras próprias de funcionamento das instituições militares.

- O Direito Administrativo Cultural
Este compreende a regulamentação jurídica do sistema escolar, da ação cultural do Estado, da defesa do património artístico, histórico e arquitetónico nacional, e igualmente da organização e funcionamento dos serviços públicos culturais, da investigação científica e tecnológica, do apoio à juventude e ao desporto, dos espetáculos, e, o regime jurídico da informação ou comunicação social.

- O Direito Administrativo Social
Neste inclui-se o regime jurídico dos serviços públicos de caráter social, como por exemplo serviços de saúde pública, educação, segurança social, serviços de transportes públicos, dentre outros.
 
- O Direito Administrativo Económico
O ramo, que consiste na regulação das relações entre o Estado e a economia, conheceu uma evolução imensa que teve como consequência a sua separação do próprio Direito Administrativo. O Direito Económico, mais abrangente, tem como objetivo o desenvolvimento económico do País, através de normas jurídicas a partir das quais o Estado determina, controla ou influencia o comportamento dos agentes económicos de modo a evitar a concorrência desleal, a manipulação de preços, entre outros.

- O Direito Financeiro
            Compreende o Direito Orçamental e da Contabilidade Pública, e, o Direito Fiscal.

   Neste âmbito, atualmente assumem particular relevo dentro do Direito Administrativo especial o Direito do Urbanismo e o Direito do Ambiente, pois são essenciais para garantir a qualidade de vida humana.

   O desenvolvimento dos direitos administrativos especiais responde mesmo pela incorporação no Direito Administrativo geral de novas e relevantes problemáticas, de novos instrumentos jurídicos, e de novas formas de participação dos cidadãos na atividade administrativa.

Fronteiras do Direito Administrativo

   O Direito Administrativo estabelece relações com os mais variados ramos do Direito, designadamente o Direito Privado, o Direito Constitucional, o Direito Judiciário, o Direito Penal, e o Direito Internacional Público.

   O Direito Administrativo e o Direito Privado podem ser primeiramente distinguidos relativamente à sua origem e idade tendo respetivamente um nascido, tal como o concebemos hoje, com a Revolução Francesa e o último na Roma Antiga . Distinguem-se de igual forma relativamente ao seu objeto: enquanto o primeiro se ocupa da administração pública e das suas relações de direito público com os outros sujeitos jurídicos, entre eles os particulares, o segundo trata das relações entre particulares, privados, que se estabelecem com base na igualdade ou paridade jurídica, na liberdade ou autonomia. Por último, outro critério de distinção será as soluções materiais: se por um lado o Direito Administrativo recorre a soluções de autoridade, baseando-se no princípio da prevalência do interesse coletivo sobre os interesses particulares, por outro, o Direito Privado assenta em soluções de igualdade entre as partes, como já referido, consagrando-se no princípio da liberdade e da autonomia da vontade.

   Apesar destas diferenças, ambos os ramos estabelecem relações recíprocas:

- No plano da técnica jurídica, isto é, em matéria de conceitos, nomenclatura e instrumentos técnicos. Atualmente, o Direito Administrativo é mais rico neste ponto do que o Direito Privado, apresentando um maior desenvolvimento nas suas noções, tanto que o Direito Privado a ele muitas vezes recorre.

- No plano dos princípios: embora hoje o Direito Administrativo já não seja considerado um ramo subordinado ao Direito Civil, tendo a sua autonomia, verificam-se influências mútuas na medida em que se assiste progressivamente a um movimento de publicitação da vida privada (consubstanciado no tratamento das relações especiais de poder, designadamente no condicionamento da autonomia contratual privada por regras tendentes a prevenir o abuso dos poderes de facto), e, todavia, em simultâneo, a um outro movimento de privatização da administração pública (concretizado na gestão privada das empresas públicas, na responsabilidade civil da administração pública, nos contratos ditos privados outorgados por esta).

- No plano das soluções concretas: se antes foi dito que hoje em dia o Direito Civil tende a beneficiar do aprofundamento dos conceitos do Direito Administrativo, também este tende a adotar determinadas soluções inspiradas por critérios tradicionais do Direito Privado. Regista-se igualmente, em múltiplos aspetos a convergência das soluções jusprivatistas e jusadministrativas.

   Com efeito, o Direito Administrativo é, como diz o jurista italiano Ugo Forti, o ramo do direito público que mais diretamente confina com o direito privado. Note-se que há inclusive um ramo do direito privado privativo da administração pública: o Direito Privado Administrativo.

   O Direito Constitucional é o ramo mais próximo do Direito Administrativo, constituindo a sua base e fundamento. São tão próximos que o estabelecimento de fronteiras entre ambos se torna extremamente difícil. De facto, o Direito Administrativo tem a tendência de seguir as orientações do primeiro, contribuindo ao mesmo tempo para lhe dar um sentido, completá-lo e integrá-lo. Neste âmbito, a nossa Constituição contém muitas normas que são formalmente de Direito Constitucional, pois estão incluídas no texto constitucional, mas que, contudo, são materialmente normas de Direito Administrativo uma vez que, devido à sua essência, conteúdo e natureza, dizem respeito à organização e à atividade da administração pública, ao exercício da atividade administrativa pública e ao relacionamento desta com os cidadãos. Assim, estas normas constituem aquela parte do Direito Administrativo que se encontra incorporada na Constituição. Adicionalmente, nem todas as normas deste ramo do direito público se encontram na Constituição, havendo as chamadas leis administrativas avulsas.

   O Direito Judiciário constitui o conjunto de normas que regulam a organização dos tribunais (que se caraterizam pela sua independência, imparcialidade e pacificidade), bem como o desempenho da função jurisdicional (a atividade que se define por resolver questões de direito que emergem de interesses e posições conflituantes, através da aplicação da Constituição e das leis, mediante decisões que em regra assumem caráter individual e concreto e são tomadas pelos tribunais). Este ramo divide-se em Direito Judiciário em sentido restrito (muito semelhante ao Direito Administrativo, porquanto procede à regulação de serviços públicos que têm como objetivo concretizar a Justiça), e em Direito Processual.

   O Direito Processual fragmenta-se por sua vez em Direito Processual Judicial (exercício da função jurisdicional pelos tribunais comuns) e Direito Processual Administrativo (exercício da função jurisdicional pelos tribunais administrativos).

   Tanto o Direito Administrativo como o Direito Penal têm como fim garantir a segurança da população e os valores fundamentais da vida em sociedade. Numa primeira análise podemos depreender que este objetivo da satisfação da necessidade coletiva da segurança é concretizado da mesma forma por ambos, porém há planos distintos. Enquanto o Direito Administrativo é um direito preventivo, estabelecendo normas com vista a prevenir a prática de crimes ou a ofensa aos valores essenciais a preservar, o Direito Penal constitui um direito repressivo, isto é, estabelece sanções penais aos autores dos crimes. O Direito Penal tem, portanto, uma natureza sancionatória, prescrevendo sanções penais a aplicar aos responsáveis pelo não cumprimento das normas.

   Por fim, no que concerne à relação entre o Direito Administrativo e o Direito Internacional é pertinente referir o ramo do Direito Internacional Administrativo que abarca as normas jurídicas relativas às administrações públicas dos Estados que, uma vez aceites por estes, regulam aspetos importantes da vida administrativa interna de cada País. Estas normas são internacionais pela sua natureza, contudo são administrativas pelo seu objeto, devendo ser estudadas no campo de ação do Direito Administrativo. Importa referir neste contexto a evolução de um movimento no sentido inverso: o crescimento do número de normas comunitárias que modificam e condicionam o Direito Administrativo interno.

Bibliografia:

ALMEIDA, Mário Aroso de, Teoria geral do direito administrativo: o novo regime do Código do Procedimento Administrativo, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2016
AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, I, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2015
CAUPERS, João, Introdução ao Direito Administrativo, 8ª edição, Âncora Editora, Lisboa, 2005
QUEIRÓ, Afonso Rodrigues, Lições de direito administrativo, I, Coimbra, 1976

Mariana Nunes
N.º de aluno 56984

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