sexta-feira, 25 de maio de 2018

Revogação e anulação administrativa


Existem, no nosso ordenamento jurídico, diversas formas de produzir a extinção ou modificação do ato administrativo. Focar-me-ei apenas na revogação e na anulação administrativa. 

Em matéria de revogação de atos administrativos, o novo Código de Procedimento Administrativo (CPA) destaca-se do anterior por ter acolhido a separação entre a revogação stricto sensu e a anulação administrativa. De acordo com o artigo 165º, se o fundamento da extinção de determinado ato se fundar em razões de mérito, conveniência ou oportunidade, estaremos perante revogação. Se, por outro lado, forem atendidas razões de invalidade estaremos perante anulabilidade administrativa.

A revogação é apresentada no nº1 do artigo 165º do CPA como o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade. Segundo o Professor João Caupers, a revogação é o principal ato desintegrativo. O autor do ato revogatório exerce uma competência dispositiva idêntica à que está na origem do ato revogado, desenvolvendo dessa forma uma função de administração ativa, sendo que quando o ato é revogado, toda a matéria que este regulava é eliminada da ordem jurídica. Por sua vez, a anulação encontra-se consagrada no nº2 do artigo já referido, onde é definida como o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro ato, com fundamento em invalidade. Na anulação, o seu autor exerce um poder de controlo com vista a suprir uma invalidade e consequente reposição da legalidade.

O Professor Diogo Freitas do Amaral utiliza como uma das formas de distinguir estas figuras os fins que cada uma prossegue. Por um lado, a revogação tem como fim a melhor prossecução do interesse público atual que é tornada possível através da reapreciação de cada caso concreto para o qual será necessária a cessão dos efeitos jurídicos do ato anterior (o ato revogado). O ato revogatório que seja praticado com vista à prossecução de fins que não o mencionado padece de desvio de poder. Além do fim de prossecução do interesse público estabelecido pelo legislador, o Professor Diogo Freitas do Amaral considera que existe um outro fundamento típico da revogação no ordenamento jurídico português, que é a imposição da revogação pelo incumprimento de cláusulas, deveres ou obrigações por parte do particular. Existe nos casos em que tal ocorra a revogação a que o Professor dá o nome de sancionatória. Pode-se considerar que a revogação tem, no nosso ordenamento jurídico, um fim duplo, isto é, tanto tem como fim a defesa da legalidade como a prossecução do interesse público. Quanto à anulação, o Professor define como seu fim a reintegração da legalidade violada, exercida através da supressão do ato que a ofendeu (o ato inválido).

O objeto destas duas figuras é a extinção dos efeitos jurídicos produzidos pelo ato revogado. Tanto a revogação como a anulação administrativa são atos secundários uma vez que os seus efeitos recaem sobre um ato anteriormente praticado, não existindo, portanto, o ato de revogação ou de anulação sem que exista esse ato anterior cujos efeitos desaparecem devido à existência do segundo.

Apontarei, de seguida, as espécies de revogação e anulação administrativa que existem no nosso ordenamento jurídico, bem como os diversos critérios nos quais se baseiam, dos quais o Professor Diogo Freitas do Amaral destaca o critério da iniciativa e o critério do autor. Quando ao critério da iniciativa, a revogação e a anulação podem ser espontâneas, que se denominam revogação oficiosa e anulação oficiosa, respetivamente, e são praticadas pelo órgão competente independentemente de qualquer solicitação de quem quer que seja; ou provocadas, que são motivadas por requerimento do interessado, em via de reclamação ou recurso administrativo, de acordo com o nº1 do artigo 169º do CPA. Quanto ao critério do autor, a revogação e a anulação podem ser feitas pelo próprio autor do ato revogado ou anulado ou por órgão administrativo diferente. No primeiro caso, isto é, quando são feitas pelo próprio autor, a revogação assume a designação de retração, enquanto no segundo caso, o ato revogatório ou anulatório é praticado pelo superior hierárquico do autor do ato revogado ou anulado em relação a atos de um subalterno ou pelo delegante ou subdelegante ou pelos órgãos com poderes de superintendência ou tutela administrativa relativamente a atos praticados por órgãos sujeitos a tais poderes, nos casos expressamente previstos pela lei.

A revogação apenas produz efeitos para o futuro, contudo pode-lhe ser atribuída eficácia retroativa pelo autor da revogação no próprio ato se esta se mostrar favorável aos interessados ou se estes concordarem expressamente com a retroatividade, como resulta do artigo 171º/1 do CPA. Quanto aos efeitos da anulação, esta produ-los retroativamente, isto é, a anulação retroage os seus efeitos ao momento da prática do ato, embora o autor da decisão possa, na própria decisão, atribuir-lhe eficácia para o futuro, quando o ato se tenha tornado inimpugnável por via jurisdicional, de acordo com o artigo 171º/3.

No que diz respeito à competência, resulta do artigo 169º do CPA que são competentes para proceder à revogação e à anulação administrativa:
a)       O autor do ato;
b)      O órgão que o praticou e o respectivo superior hierárquico;
c)       O delegante ou subdelegante;
Marco Caldeira defende que o órgão que exerça poderes de superintendência ou de tutela sobre o órgão autor do ato também tem poder de revogar e anular atos praticados pelos órgãos da entidade tutelada. Oposta a esta posição esta a do Professor Diogo Freitas do Amaral, que, pelo contrário, defende que os órgãos com poderes de superintendência ou de tutela não têm competência para revogar ou anular.

Relativamente à forma e formalidades da revogação e da anulação, e segundo o Professor Diogo Freitas do Amaral, é importante referir que em relação a elas não vigora o princípio da liberalidade de forma, mas sim o princípio da identidade ou do paralelismo das formas, isto é, tanto as formalidades como as formas do ato revogatório ou anulatório serão as mesmas do ato revogado ou anulado.

No que diz respeito às formalidades, a regra do paralelismo, consagrada no artigo 170º/3 do CPA, estipula que devem ser observadas, para a revogação e anulação, as formalidades exigidas para a prática do ato revogado ou anulado. Quanto à forma do ato revogatório ou anulatório, o Professor Diogo Freitas do Amaral defende que deve ser atendida a forma devida, isto é, deve ser seguida a forma utilizada pelo ato revogado ou anulado, tal como ocorre nas formalidades.




Bibliografia:

AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, Volume II, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2016

CAUPERS, João / EIRÓ, Vera, Introdução do Direito Administrativo, 12ª edição, Âncora, Lisboa, 2016

CALDEIRA, Marco, A figura da “Anulação Administrativa” no novo Código do Procedimento Administrativo de 2015, in Comentários ao Novo Código do Procedimento Administrativo, 2016

SILVEIRA, João Tiago, A declaração de nulidade, a anulação e a revogação na revisão do CPA, in Centro de Estudos Judiciários, 2014 http://www.joaotiagosilveira.org/mediaRep/jts/files/Revoga____o_e_anula____o_atos_CEJ_07112014_LIMPA.pdf



Andreia Agostinho, nº 56788



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