quarta-feira, 9 de maio de 2018

Simulação de Julgamento: Autores - Orquestra "Portugal Jovem"


Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa

Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa
Rua da Justiça, nº 34
1990-011, Lisboa
Parque dos Estados, Lisboa

Processo nº. 548215
Excelentíssimos Senhores Doutores Juízes de Direito,

O Grupo “Portugal Jovem”, com o número de pessoa coletiva de 856 524 888, com sede na Rua Vale Bacelos, nº. 21, 1258-333 Lisboa, representado pelos advogados Dr.ª Maria Teresa Mendonça, Dr. º Nuno Pires, Dr. º Tiago Soares Monteiro, vem apresentar a sua contestação contra a decisão do Governo, pelas vozes do Ministro e Secretário de Estado da Cultura, assim como, do Primeiro Ministro. Esta contestação tem em vista reagir contra as decisões tomadas face aos resultados do Concurso de Apoio às Artes de 2028. 

ÂMBITO DA CONTESTAÇÃO

I.                    Do Pedido
Nos termos apresentado, requer-se:
1.      A declaração de nulidade do Concurso de Apoio às Artes de 2028 com base nas violações que posteriormente serão referidas
2.      Uma nova realização do Concurso, com a correção de todos os vícios que serão apontados

II.                  Dos Factos
São emitidos os resultados do Concurso de Apoio às Artes de 2028.
De acordo com o Decreto-Lei nº 103/2017 de 24 de agosto, aprovado uma década antes, a valorização das artes constituiu um instrumento fundamental no diálogo e cooperação estratégica que deve existir entre o Estado e o setor cultural, o qual desenvolve um papel crucial no desenvolvimento equilibrado da atividade cultural no território nacional.
Assim é determinado que a Direção-Geral das Artes (DGARTES) divulgará, no final de 2027, quais os programas de apoio a lançar no ano subsequente, com base no plano estratégico previamente definido pelo membro do Governo responsável pela área da cultura.
Assim, a DGARTES estabeleceu o regime dos apoios financeiros do Estado às artes através do Regulamento do Concurso de Apoio às Artes Edição de 2028.
Os resultados deste Concurso de 2028 geraram uma enorme contestação, por todas as pessoas que se encontram, de alguma forma, ligadas ao ramo das artes.
Os protestos e críticas incidiram sobretudo sobre os montantes, critérios e execução dos mesmos, casos especiais de aplicação conducentes à exclusão ou à diminuição dos apoios à atividade artística.
Contestou-se os montantes envolvidos, considerados muito abaixo do que era expectável e desejável, que seriam 1% do PIB para a Cultura.
Os critérios utilizados foram considerados demasiados abstratos, vagos e opacos, quando deveriam ter um caráter mais concreto.
Contestou-se as fórmulas “demasiado abertas”, como por exemplo a fórmula do artigo 5º nº 1 d) do Regulamento que enuncia “a empatia provocada pelas obras artísticas”.
10º
Quanto à execução e aplicação dos critérios, valorizou-se mais a dispersão dos fundos pelo território nacional do que a dimensão dos projetos apresentados ou a continuidade de uma atividade artística, exercida durante os anos subsequentes.
11º
Contestou-se também os casos especiais de difícil compreensão, começando com o financiamento do grupo amador “Os Afonsinhos do Condado” pela sua peça sobre a independência de Portugal; da “Sociedade Financeira para a Promoção das Artes” que visava o cruzamento entre a atividade bancária e económica e o mundo da cultura; do não financiamento do “Teatro Experimental da Linha” pela recente condecoração do seu Diretor Artístico; e da “Orquestra Portugal Jovem” que se pretendia desdobrar da “Orquestra de Câmara para Todas as Idades”, com o argumento da menoridade da maior parte dos seus membros.
12º
O Governo, pelas vozes do Ministro e do Secretário de Estado da Cultura, chama a atenção para o caráter exemplar dos montantes e admite a existência de algumas situações irregulares, que podem ser corrigidas administrativamente.
13º
O Sindicato Nacional dos Agentes Culturais propõe-se a usar a via judicial para contestar as regras do concurso e os seus resultados
14º
O Governo, respondendo a isto, afirmou a sua disponibilidade para encontrar soluções negociadas e compromissórias, considerando que a matéria em causa não é suscetível de controlo jurisdicional, por pertencer à reversa da Administração.

III.                Do Direito
O Produto Interno Bruto de Portugal corresponde ao total de 200 mil milhões de euros. Se partimos da premissa de que o valor a atribuir à Cultura é de 1% do PIB, podemos deduzir que esta não foi uma afetação justa, relativamente ao valor que devia ter sido concedido verdadeiramente.
O Ministério da Cultura não tem verificado um aumento das suas verbas embora seja do conhecimento de todos que o aumento do turismo em território nacional em muito se pode dever ao património cultural existente no nosso país, bem como das atividades artísticas nacionais que têm enorme reconhecimento por todo o mundo. Assim arguimos uma violação dos artigos 73º nº3 e 78º nº1 da CRP, pelo Orçamento de Estado de 2028.
Partindo da premissa da atual limitação das verbas de apoio à cultura conjugada com artigo 4º nº2 do Regulamento, verifica-se uma situação de inconstitucionalidade, uma vez que é violado um direito fundamental de acesso à cultura, presente no Artigo 73º CRP.
Assim, exigimos que se estabeleça uma política para a cultura clara e transparente. Pois apesar de o Primeiro Ministro e Secretário de Estado da Cultura reconhecerem que não estão satisfeitos com os valores destinados à Cultura, continuam-se a destinar a outros setores grandes montantes do valor do PIB, deixando aquém das expectativas os valores atribuídos ao setor cultural.
Seria desejável que o PIB fosse distribuído de forma mais equitativa por todas as áreas e setores onde estes valores são necessários para fazer face às despesas, de modo a garantir um acesso aos cidadãos a estas áreas, nomeadamente um acesso à cultura. Tal poderá ter como consequência a formação de uma população mais informada, mais culta e mais participativa. Como tal, cabe ao Governo, mais concretamente ao Ministério da Cultura, preocupar-se e assegurar as condições para que todos tenham acesso à cultura e que possam ser criadores, agentes culturais e fruidores das artes ou artistas.
Os critérios dispostos no Artigo 5º do Regulamento são vagos e opacos, uma vez que nós não obtivemos critérios objetivos que nos permitissem aferir a qualidade e viabilidade das candidaturas ou sequer a empatia de que o presente regulamento fala, relativamente às obras artísticas. Consideramos que o Artigo referido, que concerne aos critérios de atribuição, é-nos apresentado padecendo de vaguidade, opacidade e ambiguidade.
A aplicação dos critérios valorizou a dispersão dos fundos a nível nacional, em detrimento da importância que apresentavam os projetos que se candidataram ao Concurso e de uma continuidade de aposta de um serviço público de cultura que fosse ao encontro do pressuposto constitucional consagrado no Artigo 73º nº4 e sua respetiva concretização no Artigo 78º CRP.
Cabe agora referir que estamos perante um ato administrativo, como disposto no Artigo 148º CPA, visto que é uma decisão individual e concreta. As menções obrigatórias referidas no artigo 151º CPA encontram-se preenchidas. Podemos classificar este ato administrativo como sendo permissivo, que confere ou amplia vantagens, sendo classificado como uma subvenção: ato pelo qual um órgão da Administração atribui a um particular uma quantia em dinheiro destinada a cobrir os custos inerentes à prossecução de uma atividade privada, reconhecida de interesse público.
Posto isto, e estando nós perante um ato administrativo, podemos referir que estão a ser violados princípios administrativos que serão agora enunciados.
10º
A discricionariedade exprimida pelos critérios é demasiado excessiva. Não se admitem critérios de decisão como os que foram utilizados, pois os mesmos não explicam de forma clara o modo que deve ser seguido para proceder a uma escolha correta.
11º
Nos critérios que são apresentados, as referências a “qualidade artística e relevância cultural do projeto” e “mérito e adequação” mostram a referida opacidade e vaguidade.
12º
Como tal, e tendo em conta a opacidade dos critérios, é impossível o cumprimento do princípio da boa administração consagrado no Artigo 5º CPA (e 266º nº1 da CRP), pois com a utilização destes critérios não se irá verificar a desejada eficiência por parte da Administração, o que leva a uma consequente violação do Artigo 81º c) da CRP, que enuncia que é da competência do Estado zelar pela eficiência da Administração.
13º
Em consequência da vaguidade dos critérios utilizados, poderá verificar-se que não se trata de forma justa todos os intervenientes, na relação com a Administração, pelo facto de a interpretação ser demasiado livre, podendo levar a situações de baixa segurança jurídica e de soluções pouco razoáveis. Ou seja, encontra-se aqui uma clara violação do princípio da justiça e da razoabilidade, consagrado nos Artigos 8º CPA e 266º nº 2 da CRP.
14º
Os presentes critérios não valorizam a qualidade, mas sim única e exclusivamente a distribuição totalmente igualitária pelo país. Denota-se uma clara violação do princípio da igualdade, que vem consagrado no Artigo 6º CPA e nos Artigos 266º nº2 e 13º CRP.
15º
A violação de todos os princípios supra enumerados gera anulabilidade dos termos do artigo 163º/1 CPA.
16º
Nos casos concretos, não é de fácil compreensão o porquê do financiamento do grupo amador “Os Afonsinhos do Condado” e da “Sociedade Financeira para a Promoção das Artes” em detrimento da Orquestra “Portugal Jovem”, representada por nós, através de procuração.
17º
Quanto ao grupo amador “Os Afonsinhos do Condado”, entendemos que o critério de decisão não é equitativo face aos demais grupos, pois o fundamento de “inegável interesse turístico” não é equitativo, uma vez que o mesmo pode ser usado em quaisquer outras peças de outros grupos. Até podemos argumentar que aqui há uma situação que viola o princípio da imparcialidade do Artigo 9º do CPA.
18º
Quanto ao financiamento da “Sociedade Financeira para a Promoção das Artes”, podemos começar por referir que não faz sentido que este financiamento exista, pois não se trata de competência do Estado investir numa iniciativa societária, ou seja, numa iniciativa privada. Visa-se a existência de uma autonomia da cultura que não deve ser cruzada com outras áreas.

19º
Ainda quanto ao financiamento da “Sociedade Financeira para a Promoção das Artes” é de referir que este financiamento viola o Artigo 6º nº2 do Regulamento, partindo nós da premissa que a Sociedade detém um fim lucrativo. Isto porque as sociedades, a nível de Direito, são pessoas coletivas de base associativa, com fim lucrativo.
20º
A Orquestra “Portugal Jovem” pretende desdobrar-se da “Orquestra da Câmara para Todas as Idades”. Face este pedido, foi decidido que não haveria qualquer financiamento para tal, devido à menoridade da maior parte dos seus membros. Em primeiro lugar, há uma grande violação ao dever de fundamentação, exigido nos Artigos 151º nº1 d) e 152º nº1 a) do CPA, visto que a premissa da “menoridade dos seus membros” não preenche os requisitos dispostos no Artigo 153º do CPA. O Prof. Doutor Vasco Pereira da Silva defende que a fundamentação é um direito constitucionalmente protegido. Como tal, de acordo com os Artigos 161º nº2 d) do CPA e 268º nº3 da CRP, o ato é nulo. Se tal não for suficiente, isto é, se a fundamentação não for vista como um direito fundamental, aplica-se o regime de anulabilidade que consta do Artigo 163º do CPA. De notar ainda que estamos perante um argumento ad hominem, falacioso, onde emerge um ataque pessoal.
21º
Aliás, podemos até usar facilmente o argumento dado a nosso favor. Quanto ao não financiamento da Orquestra “Portugal Jovem”, começamos por defender que o financiamento desta seria muito importante, se tivermos em conta que este constituiria um grande apoio a uma faixa etária mais nova que não possui quaisquer rendimentos. Ou seja, sendo menores, não possuem rendimento. Logo, faz sentido que o financiamento seja atribuído à Orquestra “Portugal Jovem”. Até porque qualquer País considera como sendo muito importante a promoção do gosto da população mais jovem pela cultura. Em Portugal, é um direito fundamental o acesso à cultura, como podemos ler nos Artigos 70º, 73º e 78º da CRP.
22º
Para além do mais, não houve audiência prévia dos interessados (Artigo 121º do CPA), que constitui o momento por excelência de participação dos interessados na formação das decisões que lhes digam respeito. Como tal, é considerado como sendo um direito constitucionalmente previsto no Artigo 267º nº5 da CRP. Por isso, e de acordo com o Artigo 161º nº2 d) do CPA, é um ato nulo.
23º
Com tudo o que foi exposto, podemos afirmar sem qualquer margem de dúvida, que estamos perante uma série de vícios e violação de normas presentes no Código do Procedimento Administrativo. Defendemos a anulabilidade do ato com base no Artigo 163º nº1 do CPA.
24º
Por fim, é verdade que o Governo argumentou que a matéria não é suscetível de controlo jurisdicional, por se tratar de uma reserva da Administração. Aqui devemos salientar que uma reserva da Administração é igual a uma reserva de lei.
25º
No entanto, o argumento do Governo não é válido, pois não estamos perante uma matéria com livre margem de apreciação, visto que foram violados os critérios de atribuição do financiamento. Ou seja, a discricionariedade, que está limitada pelas vinculações onde se enquadra a existência da margem, o fim, a competência e a vontade esclarecida, pelos limites previstos na norma jurídica, e que são compostos pelos princípios gerais da atividade administrativa. A violação destes parâmetros gera uma ilegalidade.
26º
Assim, de acordo com o que foi referido anteriormente, o Concurso de Apoio às Artes de 2028 padece de vários vícios. Logo, este deve ser considerado nulo, não produzindo efeitos jurídicos, de acordo com o artigo 162º nº1 do CPA.
26º
Na hipótese de o Concurso de 2028 não ser considerado nulo depois da decisão dos juízes, arguimos que o mesmo padece de anulabilidade.

Da Prova
Documental – anexos













Anexos
// PROCURAÇÃO //

O Grupo “Portugal Jovem”, pessoa coletiva de 856 524 518, com sede na Rua Vale Bacelos, nº. 21, 1258-333 Lisboa representada pelo seu Presidente João Miguel Camões, Solteiro, residente na Rua da Ponte, nº 21 1900-083 Lisboa, NIF 250509577, constitui seus bastante procuradores os SRS. DRS. MARIA TERESA MENDONÇA, NUNO PIRES E TIAGO SOARES MONTEIRO, Advogados, com escritório na Avenida de Roma, nº 149, 1900-151 Lisboa, à qual confere – com os de substabelecer – os mais amplos poderes forenses gerais em Direito permitidos.


Lisboa, 5 de Maio de 2018


O coordenador do Grupo,
João Miguel Camões
(João Miguel Camões)



PIB PORTUGAL: 205.184.000.000€ | FONTE: BANCO MUNDIAL, SITE OFICIAL


Maria Teresa Mendonça
Nuno Pires
Tiago Soares Monteiro

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