O ato administrativo ferido
O ato administrativo é o ato jurídico unilateral praticado, no exercício do poder administrativo, por um orgão da Administração ou por outra entidade publica ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz a decisão de um caso considerado pela Administração, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
Segundo a doutrina do PROF. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, a existência de um ato administrativo pressupõe a existência de um autor, destinatário e conteúdo/objeto. Um ato será eficaz quando preencha os requisitos exigidos por lei e assim produza os efeitos jurídicos desejados. A validade define-se pela sua aptidão intrínseca do ato administrativo para produzir efeitos jurídicos correspondentes ao tipo legal a que pertence, em consequência da sua conformidade com a ordem jurídica.
Quando um dos elementos constitutivos do ato administrativo não estiver presente, estaremos perante situações de ineficácia e invalidade do ato. A invalidade consiste num valor jurídico negativo que afeta o ato administrativo impossibilitando o mesmo de produzir quaisquer efeitos jurídicos, decorrente de uma ofensa à ordem jurídica. A ineficácia, por seu turno, define-se pela não produção de efeitos num dado momento, independentemente da sua causa.
Seguindo a doutrina do PROF. VASCO PEREIRA DA SILVA, de agora em diante, desenvolveremos apenas as regras de validade e de eficácia. No seu entender, existem duas formas de invalidade, a nulidade e a anulabilidade. A nulidade encontra-se presente no art.º 161 CPA, e consiste na não produção de efeitos jurídicos, “independentemente da declaração de nulidade”, sendo que, se produzirem efeitos estes têm-se como não produzidos. Por sua vez, os atos anuláveis produzem efeitos jurídicos, mas vem a ser afastados da ordem jurídica quer por vontade da Administração, quer por vontade de um particular. Face este pedido, os atos anuláveis são afastados com efeitos retroativos da ordem jurídica. Contudo, se ninguém fizer o pedido de anulabilidade (art.º 163 CPA) o ato continuará a produzir efeitos.
Como já fizemos referência, para que o ato produza efeitos jurídicos, é necessário que este preencha determinados requisitos, podemos aqui enunciar os requisitos de competência, formais, materiais e procedimentais. Quando estes requisitos não sejam cumpridos, haverá uma ilegalidade do ato administrativo. A ilegalidade do ato administrativo pode assumir diversas formas, a estas formas denominamos de vícios do ato administrativo, por sua vez, o prof. Freitas do Amaral define-as como “as formas especificas que a ilegalidade do ato administrativo pode revestir”.
Os vícios do ato administrativo não possuem consagração expressa no CPA de 2015, porém, devido ao trabalho desenvolvido pela doutrina e jurisprudência portuguesa, podemos elencar cinco tipos de vícios, são eles a usurpação de poder e a incompetência, que segundo o Prof. Freitas do Amaral corresponde a uma ideia de ilegalidade orgânica. Por conseguinte, o vicio de forma que corresponde à ideia de ilegalidade formal. E por fim, a violação da lei e o desvio de poder que tem por base a natureza de uma ilegalidade material. Mas em que é que cada um consiste? Passaremos a explicar.
A usurpação de poder, na doutrina do PROF. FREITAS DO AMARAL, “é o vicio que consiste na prática por um órgão administrativo de um ato incluído nas atribuições do poder legislativo, do poder moderado ou do poder judicial”. Este vicio é uma clara demonstração da violação do princípio da separação de poderes, para melhor demonstrar esta afirmação, podemos dar como exemplo a criação de um imposto por ato administrativo, sendo que, a criação de impostos apenas poderá ser feita pelo poder legislativo.
A incompetência poderá ser definida como “o vicio que consiste na prática, por um órgão administrativo, de um ato incluído nas atribuições ou na competência de outro órgão administrativo”. Dada a similitude, parece necessário distinguir a incompetência da usurpação de poder. Enquanto que, a usurpação de poder sucede quando, por exemplo, o poder executivo invada a esfera de outro poder do Estado, já na esfera da incompetência, é preciso que o órgão administrativo que praticou o ato invada a esfera própria de outra autoridade administrativa, mas sem sair do âmbito do poder administrativo. Podemos, dentro da incompetência falar em incompetência absoluta e relativa, e dentro desta última, fazer referência a incompetência em razão da matéria, em razão da hierarquia, em razão do lugar e em razão do tempo.
O vicio de forma consiste na preterição de formalidades essenciais ou na carência de forma legal. Podemos aqui distinguir três modalidades, a preterição de formalidades anteriores à prática do ato, como por exemplo a falta de audiência prévia dos interessados num procedimento administrativo, a preterição de formalidades relativas à prática do ato, como por exemplo, as regras sobre votação em órgãos colegiais e a carência de forma legal, que poderá surgir quando se revista um ato de despacho quando a lei exige a forma de portaria ou decreto.
A violação da lei define-se pela discrepância entre o conteúdo ou o objeto do ato e as normas jurídicas que lhe são aplicáveis. A ofensa aqui verifica-se no próprio conteúdo ou no objeto do ato, daí possuir uma ilegalidade de natureza material.
O desvio de poder consiste no exercício de um poder discricionário por um motivo principalmente determinante que não condiga com o fim que a lei visou ao conferir tal poder, sendo que, caso um ato seja praticado em desvio de poder será nulo como prevê o art.º 161 nº2 alínea e)
Do ponto de vista do PROF. VASCO PEREIRA DA SILVA, esta tipologia de vícios é ilógica, já que, não segue um critério lógico, não esgotando os vícios existentes na ordem jurídica, não sendo, do ponto de vista científico, rigorosa. Neste sentido, e perfilhando a opinião do Prof. GONÇALVES PEREIRA, ficam de fora da teoria dos vícios, os vícios da vontade da Administração, como o erro, dolo e coação. Durante muitos anos, e seguindo a posição de MARCELLO CAETANO, a jurisprudência do STA quando anulava um ato administrativo por erro, dolo ou coação, fundamentava a anulação por violação de lei. Contudo, mais tarde a jurisprudência passou a anular, tendo por base um erro de facto, ou em dolo ou coação, sem reconduzir o erro de facto a nenhuma ilegalidade.
Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo Vol. II 4ª edição
Mário Aroso de Almeida, Teoria Geral do Direito Administrativo 3ª edição
Sofia França nº 62969
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