Administração directa e Administração Indirecta do Estado
Para começar, no que diz respeito à organização administrativa portuguesa é pertinente fazer uma alusão à administração directa e administração indirecta do estado. Posto isto, enquanto entidade administrativa, o estado não é soberano, pratica antes um poder constituído subordinado à lei, sendo no plano administrativo uma entidade jurídica de per si e autónoma, distinguindo-se por isso de outros sujeitos de direito.
Ao abordar primeiramente a administração directa central do estado será proveitoso caracterizar este último, como dotado de personalidade jurídica, sendo que dentro dele não existem pessoas colectivas, contudo sujeito à sua hierarquia encontram-se os órgãos do estado: Presidente da República, Assembleia da República, o governo e os tribunais. Convém contudo ter em devida conta que os tribunais e a Assembleia da Republica não fazem parte do poder executivo, não integrando consequentemente a administração, por pertencerem a outros poderes do estado.
Quanto ao Presidente da Republica, na opinião do professor doutor Freitas do Amaral, este não é um órgão administrativo mas sim politico, pois a competência para nomear altos funcionários da administração publica, por exemplo, significa simplesmente fazer intervir uma figura que com a sua assinatura possa conferir solenidade especial à investidura de determinados funcionários. Saliente-se no entanto que tanto o presidente da republica como a assembleia da republica, assim como certos órgãos do poder judicial podem segundo a lei praticar actos materialmente administrativos, embora sujeitos a controlo pelos tribunais administrativos.
Continuando o tratamento da administração central do estado, é crucial e imprescindível mostrar a importância que o governo assume enquanto órgão do estado. Este, diferentemente, além de ser órgão politico é simultaneamente órgão administrativo a título principal, permanente e directo. É o órgão principal da administração central do estado, incumbido do poder executivo. O governo não só dirige a administração directa do estado, como superintende a administração indirecta e tutela esta ultima. O governo pode exercer as suas competências por forma colegial através do conselho de ministros ou também pode exercer individualmente através dos membros que dele fazem parte (primeiro-ministro, ministros, secretários de estado ou subsecretários de estado).
O primeiro ministro é o chefe do executivo e dirige o funcionamento do governo, coordenando e orientando a acção de cada um dos ministros através das suas funções de chefia e administra ou gere os serviços próprios da presidência do conselho ( o primeiro dos ministérios do país) através das suas funções de gestão.
Os órgãos consultivos têm por função proferir pareceres destinados a elucidar os órgãos deliberativos. Os órgãos ou serviços que exercem poderes genéricos de controlo e de inspecção sobre o conjunto da administração pública são o Tribunal de Contas e a Inspecção-Geral das Finanças. Os direitos, liberdades e garantias são entendidos como ferramentas que os cidadãos utilizam para se defenderem do poder público. Como é do senso comum, o governo é perspectivado como um agressor potencial dos direitos em causa, daí que seja necessário configurar um aglomerado de órgãos que estejam afastados dessa máquina administrativa, órgãos não sujeitos aos poderes de direcção, superintendência ou tutela do próprio governo, tomemos como exemplo o provedor de justiça. Por conseguinte o que todos estes órgãos partilham é a necessidade de defesa de direitos dos administrados.
É possível constatar as atribuições do estado na constituição, na lei ordinária e nas leis orgânicas dos diferentes ministérios, em especial, nas leis orgânicas das direcções gerais dos ministérios. A história revela que as atribuições do estado aumentaram incessantemente, estas correspondem aos fins e objectivos da pessoa colectiva. Enquanto que as atribuições do estado encontram-se estabelecidas por forma dispersa, as atribuições das demais pessoas colectivas encontram-se definidas por forma integrada. Tem-se presente, não obstante, que em ambos os casos as atribuições têm de resultar expressamente da lei. O estado dispõe de serviços locais que são serviços públicos encarregados de preparar e executar as decisões dos diferentes órgãos locais do estado. Quanto à sua classificação, o autor Bernard Gournay agrupa-as em: principais, auxiliares e de comando.
Importa agora traçar uma comparação/analogia entre a administração directa e a administração indirecta do estado quanto a vários aspectos que serve destacar.
Relativamente ao seu desempenho, a administração directa do estado é a actividade exercida por serviços integrados na pessoa colectiva estado, enquanto que a administração indirecta do estado é uma actividade que embora desenvolvida para a realização dos fins do estado, é exercida por pessoas colectivas públicas distintas do estado.
Em segundo lugar, para uma melhor compreensão é apropriado referir alguns exemplos. Assim, quanto a serviços pertencentes à administração directa importa salientar a presidência do conselho, os ministérios, as secretarias de estado e as direcções gerais, já assinalados outrora. No que tange à administração indirecta podemos mencionar o instituto português do desporto e juventude, o laboratório nacional de engenharia civil e a fundação para a ciência e tecnologia.
Outro aspecto a salientar é o carácter originário do estado na administração directa, pois este enquanto pessoa colectiva não é criado pelo poder constituído, tendo natureza originária. Contrariamente, as outras pessoas colectivas públicas são sempre criadas ou reconhecidas por lei, tendo natureza derivada. Daí decorre que os órgãos de soberania não estejam incluídos na administração indirecta mas sim na administração directa do estado.
Segue-se o facto de o estado ser uma pessoa colectiva de fins múltiplos, podendo prosseguir diversas atribuições. Nisto se distingue por exemplo, dos institutos públicos que só podem prosseguir fins singulares, ou seja desempenham actividades públicas de carácter administrativo mas determinadas, no sentido de que logicamente as suas atribuições não podem ser indeterminadas, nem abranger uma multiplicidade genérica de fins, somente podem tratar das matérias que especificamente lhes sejam concedidas por lei, afirmando-se deste modo como uma entidade de fins singulares, com vocação especial.
Evidencie-se agora a organização em ministérios como característica da administração directa, pois nela se encontram estruturados em departamentos, organizados por assuntos ou matérias, os quais se denominam de ministérios. O mesmo não se pode dizer dos institutos publico, onde a estruturação é mais solta e desligada, podendo cada vereador ou membro da gerência dirigir num determinado dia certos serviços e noutro outros, sem mudança de lugar.
Diferem igualmente no ponto de vista da instrumentalidade, na medida em que a administração do estado é subordinada, não é independente nem autónoma, sendo essa a razão de a constituição submeter a administração directa do estado, civil e militar, ao poder de direcção do governo. Já a administração indirecta fica sujeita apenas à superintendência e tutela do governo, as empresas públicas e os institutos públicos, a titulo de exemplo, estão sujeitos à intervenção do governo, as empresas públicas gozam de autonomia embora não sejam independentes nem se auto-administrem (como as autarquias locais) pois elas desenvolvem uma administração estadual indirecta, tendo os seus órgãos autonomia de gestão, contudo têm de se conformar com os objectivos fixados pelo governo. Há porem dependência, ainda que conexa a uma relativa autonomia de gestão.
Outro aspecto a realçar é a supremacia do estado-administração, dado o seu carácter único, originário e instrumental em relação aos fins do estado. O grau ou a intensidade desses poderes varia consoante a maior ou menor autonomia que a ordem jurídica concede ás pessoas colectivas publicas: os institutos públicos e as empresas publicas estão sujeitas a superintendência do governo como decorre do exposto, dado que o estado exerce poderes de supremacia em relação aos sujeitos de direito privado como também sobre outras entidades publicas, por esse motivo o estado é designado ente publico máximo/supremo e ás demais pessoas colectivas se dá a designação de entes públicos subordinados.
Outro ponto a ressaltar prende-se com o facto de a administração estadual indirecta ter ainda algo a ver com o estado mas sob uma forma indirecta ou mediata, apesar da maior parte dos fins ou atribuições serem prosseguidos de forma directa ( pela própria pessoa colectiva a que chamamos estado) e de forma imediata (sob a direcção do governo, na sua dependência hierárquica, uma vez que a administração directa do estado encontra-se estruturada em termos hierárquicos por considerações de eficiência, dado o elevado numero de funcionários públicos e agentes que trabalham no estado, mas também por razoes de coerência com o principio da instrumentalidade).
Divergem de igual forma num outro aspecto que importa enfatizar: na administração directa fala-se em desconcentração, pois os serviços ou organismos que, embora incorporados no estado, desempenham as suas funções com uma certa autonomia, continuam no entanto perante uma administração central desconcentrada, em que os órgãos tem sempre um poder embora controlado e sempre sujeito à hierarquia da pessoa colectiva estado. Em contraste, na administração indirecta só faz sentido falar em descentralização de poderes, situação em que os fins do estado são prosseguidos por outras entidades que não o estado: o estado confia a outros sujeitos de direito a realização dos seus próprios fins. Administração estadual, uma vez que se trata de prosseguir os fins do estado e indirecta, porque não é realizada pelo próprio estado, mas sim por outras entidades que ele cria para esse efeito na sua dependência.
Elaborado o paralelismo entre administração directa e administração indirecta do estado, cabe aludir brevemente a alguns tópicos ainda não indicados.
Assim, do que foi dito podemos concluir que a administração directa central está directamente relacionada com o estado, sendo este a única pessoa colectiva que existe, o seu núcleo é o governo, juntamente com os seus ,ministros e respectivos ministérios e o primeiro ministro. Porém, a administração directa do estado não engloba apenas a administração central, mas também a administração periférica/local, que é definida como o conjunto de órgãos e serviços de pessoas colectivas publicas que dispõem de competência limitada a uma área territorial restrita e funcionam sob a direcção dos órgãos centrais. Os seus órgãos e serviços funcionam sempre na dependência hierárquica dos órgãos centrais da pessoa colectiva a que pertencem. Assim nem todos os órgãos e serviços do estado exercem competência extensiva a todo o território nacional, nem todos são, pois órgãos e serviços centrais. Há também órgãos e serviços locais, instalados em diversos pontos do território nacional e com competência limitada a certas áreas, circunscrições.
No que concerne à administração estadual indirecta, é preciso ter patente que os organismos incumbidos são os institutos públicos, de natureza burocrática, com funções de gestão publica e as empresas publicas que tem natureza empresarial e desempenham actividade de gestão privada. A separação entre ambos baseia-se também na distinção entre o sector publico administrativo (SPA) e o sector publico empresarial (SPE). Este principio da gestão privada que caracteriza este ultimo sector, constituído apenas pelas empresas publicas justifica-se pela natureza do seu objecto, pela índole especifica da actividade a que se dedicam, são organismos que precisam de uma grande liberdade de acção, de uma grande maleabilidade e flexibilidade no seu modo de funcionamento, daí o direito aplicável à sua Actividade ser o direito privado (civil ou comercial).
Do exposto podemos concluir que no plano administrativo o que realmente importa é a orientação superior do conjunto da administração publica pelo governo, a distribuição de competências pelos diferentes órgãos centrais e locais e a separação entre o estado e as demais pessoas colectivas publicas. O estado é uma pessoa colectiva e por isso tem atribuições e finalidades que constituem o motivo pela qual a pessoa colectiva nasceu. Para que esses objectivos sejam executados, sujeito à sua hierarquia encontram-se os órgãos do estado, que através das suas competências vão dar vida à pessoa colectiva. Deste modo podemos afirmar com segurança que a pessoa colectiva aspira e ambiciona e o órgão faz surgir, por outras palavras faz encarnar.
Bibliografia:
Amaral, Diogo Freitas, Curso de Direito Administrativo I, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2015.
Teresa Catarina Pereira, Nº 56989, Turma B, subturma 10.
quinta-feira, 2 de novembro de 2017
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