quarta-feira, 1 de novembro de 2017

A disfunção da Proteção Civil em Portugal na sombra da crise permanente do serviço publico numa Europa globalizada


Vivemos presentemente numa conjuntura de fragilidade económica, instabilidade politica e naturalmente com alguma exaltação social, mas se consultarmos a historia verificamos que estes fenómenos não são recentes e apuramos com uma certa facilidade que vivemos ininterruptamente na chamada “crise” quer em Portugal quer na Europa ou mesmo a nível mundial, na medida em os fenómenos dos outros países não são alheios à nossa realidade.

Hoje convivemos com a palavra “crise” como fazendo parte do nosso dia-a-dia, temos mesmo a ideia que há sempre uma crise que nos espreita, Jean Monnet ensinou-nos que a Europa será construída em crise e será a soma das soluções adotadas para cada crise.

Contemporaneamente o serviço publico encontra-se diante de uma nova “crise”, o Estado deixou de protagonizar atividades empresariais não essenciais efetivando uma retração na prestação direta de serviços públicos e discute-se analogamente a sua própria operabilidade para articular as prestações publicas.

Neste contexto, na esfera especifica do serviço publico, poderemos considerar que em Portugal a “crise” do serviço publico é um estado permanente ou será a forma de criar tensão e chamar a atenção de todos para a emergência da resolução dos problemas do dia-a-dia. O conceito sustentado de “crise” tem, basicamente, uma carga negativa problemática implícita, porém a palavra “crise” pode apontar para algo positivo como a mudança.

Um dos paradigmas da mudança verificada na Administração Publica foi a transformação das relações da Administração Publica com o individuo que foram profundas quando o Estado liberal, berço do direito administrativo que é o   cerne do serviço publico, foi substituído pelo Estado Prestador de Bens e serviços públicos. Com efeito esta nova relação da Administração Publica neste novo direito administrativo  e a própria modificação da noção da Administração Publica e da consequente alteração do conceito de serviço publico não acarretou de forma alguma a sua “morte” ou “crise”, mas sim refletiu a evolução firme do instituto.

Joaquim Araújo, professor de Administração Publica na Universidade do Minho, refere que o percurso da reforma da Administração Publica em Portugal seguiu, nas ultimas décadas, um percurso idêntico àquele que se verificou noutros países da OCDE (Organização para a cooperação e Desenvolvimento Económico). Apesar das indefinições iniciais a partir da década de 80 a estratégia de reforma assume uma orientação de mudança centrada no protótipo gestionário e que tem perdurado nas propostas de reforma apresentadas.

É consensual que a Administração Publica tem a obrigação de prosseguir o interesse publico, ou seja, o bem comum da forma mais eficiente possível, tendo sempre em vista a satisfação das necessidades coletivas. Neste sentido é necessário também que a lei e o direito desempenhem o seu papel de conformar as decisões publicas e garantir a previsibilidade, geradora de confiança na sociedade e agentes económicos.   

Aquiescemos também a necessidade de reformar a Administração Publica e a necessária descentralização pois esta Administração tornou-se grande de mais para resolver pequenos problemas que requerem proximidade, sendo sobremaneira elementar racionalizar custos e fazer poupanças.

Esta reforma da Administração Pública que já se fala há muito tempo tornou-se ainda mais urgente face à revelação da crise económica mundial, tornando-se assim um dos temas da agenda politica da maior parte dos países Ocidentais inclusive Portugal.

Com o intuito da mudança nas ultimas décadas foram levadas a cabo várias reformas em Portugal entre elas e mais recentemente o XVII Governo Constitucional Português tomou várias iniciativas de modernização administrativa, como é o caso da reorganização do aparelho administrativo resultante do PRACE (Programa de Restruturação da Administração Central do Estado) e voltou a ser criado pelo XIX Governo Constitucional um “novo PRACE” denominado PREMAC (Plano de Redução e Melhoria da Administração Central do Estado).

Os governos o longo da historia para executar a reforma da Administração Publica têm vindo a criar, a extinguir ou fundir organismos. Foi precisamente nesta envolvente que foi criada em 2007 a ANPC (Autoridade Nacional da Proteção Civil), sucedendo ao Serviço Nacional de Bombeiros e Proteção Civil que já havia resultado da fusão do Serviço Nacional de Proteção Civil com o Serviço Nacional de Bombeiros e a Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais. Ainda em 2012 a ANPC viu as suas atribuições alargadas, aquando da extinção do Conselho Nacional de Planeamento Civil de Emergência integrando as respetivas competências nesta Autoridade e recentemente, no seguimento do processo de extinção da Empresa de Meios Aéreos, passou a ter também atribuições na área da gestão dos meios aéreos pertencentes ao Ministério da Administrração Interna.

A ANPC de acordo com o Decreto Lei 73/2013 carateriza-se juridicamente por ser um serviço central da administração direta do Estado sendo dependente do Ministério da Administração Interna  e portanto do Governo de Portugal tem como missão planear, coordenar e executar a politica publica de proteção civil,  deverá assim fortalecer a prevenção e reação a acidentes graves e catástrofes a proteção e socorro das populações e a direção das atividades dos bombeiros.

Esta reforma levada a cabo neste organismo da Proteção Civil como em todos os outros tem de refletir-se na vida quotidiana do cidadão e isto tende a não acontecer. Houve avanços notórios, mas não os suficientes, os Portugueses continuam a não confiar na Proteção Civil depois de todo o desenvolvimento que esta tem tido nos últimos anos. Os cidadãos questionam-se se será um problema de capacidade ou se a Proteção Civil não passa de um sistema instrumental nas mãos dos decisores.

Não há consenso sobre a melhor maneira de comparar ou avaliar os sistemas administrativos dos diferentes países, principalmente porque as correntes teóricas sobre Administração Publica têm abordagens diferentes sobre a ciência administrativa. Convencer os cidadãos que a reforma é mais que uma retórica é um verdadeiro desafio pois como apontou Kaufman nos anos 90 as tentativas de reforma enfrentam a resistência de interesses organizados quer porque procuram manter os benefícios da manutenção do status quo quer pela oposição calculada à mudança ou simplesmente pela reduzida habilidade dos interesses organizados em promover mudanças. 

Os Portugueses demonstraram muito recentemente os seus receios em relação à Proteção Civil numa sondagem Europeia feita em 2015 sobre a credibilidade da Proteção Civil, na qual apenas 23% dos Portugueses inquiridos consideraram “que estava a ser feito o suficiente “ em Portugal em matéria de prevenção de desastres , valor aquém da média da UE ( União Europeia), estes temores vieram a ser confirmados nos fogos de 2017 em território nacional, com a visível falta de coordenação levada a cabo pela Proteção Civil que provocou dezenas de mortos  para alem do desastre ambiental.

A disfunção ou a critica feita à Proteção Civil Nacional é parecida com as criticas feitas as outras áreas da Administração Publica: ineficiente, o excesso de burocratização, a irresponsabilidade, os elevados custos e a falta de sensibilidade relativamente às necessidades dos cidadãos. Para mudar verdadeiramente a Proteção Civil tem de ser capaz de ser exemplo de referência, prever, planear, antecipar, gerir a informação, gerir as consequências dos fenómenos, repor assim a normalidade da vida.

A importância deste tema resulta verdadeiramente do facto da Administração Publica tanto poder ser o instrumento principal da aplicação das politicas, do desenvolvimento do país, do bem-estar das pessoas ou representar o contrario de tudo isto como parece acontecer nos dias de hoje. 

Bibliografia

Araujo, Joaquim Filipe Ferraz Esteves de (2005). “A Reforma Administrativa em Portugal : em busca de um novo paradigma ( working paper)”. Braga: Universidade do Minho – Núcleo de Estudos em Administração e Politicas Publicas (http://hdl.handle.net/1822/3274)

Caupers, João (2009). “Introdução ao Direito Administrativo”. Lisboa : Ancora

Heriques,Denise (2007). “Serviço de Imprensa da EU e Modernização Administrativa”. In Juan Mozzicafreddo; João Salis Gomes; João S. Batista(org.) – Interesse Publico: Estado e Administração, Lisboa: Celta, pp.267 – 294

Kaufman,Herbert(1995). “The limits of organizational change. New Brunswick” Transaction Publishers

Pereira da Siva, Vasco (1995). “Em busca do Acto Administrativo Perdido”, Colecção Teses Almedina

Fontes :

Os cadernos EuroDefense – Portugal – http: www.eurodefense.pt/publicações/)

Boletim bimestral da Autoridade Nacional de Proteção Civil/nº95/março/abril 2017/ISS1646-9542http://www.prociv.pt/ptpt/SITUACAOOPERACIONAL/Paginas/default.aspx


OPCSA – ISEC LISBOA – Observatório de Proteção Civil & Safety-htt//www.linkedin.com/shareArticle



Vanda Peixoto , aluno nº 57193, Subturma 10 , Turma B

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