A figura da conferência procedimental corporiza uma
das novidades da revisão de 2015 do Código do Procedimento Administrativo (doravante
mencionado como CPA), consagrada atualmente num capítulo autónomo, na parte III
(cf. artigos 77º e seguintes).
Esta integra-se no modelo de coordenação de inspiração
italiana que, pela colaboração entre vários órgãos da Administração Pública,
visa concretizar um dos objetivos da revisão do CPA – a simplificação administrativa.
Assim, a conferência procedimental visa pela reunião (a dita conferência) das
várias autoridades administrativas envolvidas no procedimento, a chegada a uma
tomada de decisão única, ou a uma tomada de decisões conjugadas (cfr. artigo 77º/1).
Modalidades
Conforme disposto nos artigos 77º e seguintes, a conferência
procedimental é exprime-se em diversas modalidades.
A primeira modalidade diz respeito ao procedimento
simples (único), que visa a tomada de uma única decisão final, pela reunião do órgão
competente para a tomada da decisão final e pelos órgãos competentes para a prática
de atos pré-decisórios necessários à tomada de decisão. Neste caso aplicando-se
paradigmaticamente o disposto no artigo 77º/5 relativamente aos órgãos consultivos
competentes para a emissão de pareceres vinculativos, e por remissão o artigo 79º/7,
quanto à forma do parecer.
A segunda modalidade ocorre no âmbito do procedimento
complexo, que tem como objeto a tomada de mais do que uma decisão, ou no âmbito
de procedimentos conexos entre si, que têm como objeto a tomada de decisões autónomas,
mas referentes a vários aspetos de um mesmo projeto, atividade ou iniciativa).
Nesta segunda modalidade, o CPA distingue ainda duas
configurações distintas:
a) A
conferência deliberativa (cfr. artigo 77º/3/a), consiste na reunião dos órgãos intervenientes
num exercício em comum das suas competências (cfr. artigo 77º/1) através da
tomada de uma única decisão (crf. artigo 77º/2). Deste modo, a tomada de decisão
autónoma de cada órgão é substituída pela tomada de um ato único complexo. Isto
primeiro significa que, visto que cada órgão tem o poder de tomar uma decisão própria,
a deliberação para ser positiva tem de reunir a expressão unânime de todos os órgãos
intervenientes, caso haja uma única posição divergente no sentido do indeferimento,
a pretensão do interessado é indeferida por um ato complexo de indeferimento (cfr.
artigo 81º/5). Contudo, na sequência de uma deliberação negativa, podem os órgãos
intervenientes que não se objetaram à pretensão, podem dentro da sua competência,
praticar individualmente um ato administrativo em sentido positivo, no prazo de
8 dias após a data da conferência (crf. artigo 81º/6).
Em segundo lugar, o facto de o ato
ser único e complexo tem outras implicações: que só todos os órgãos em conjunto
podem anular ou revogar o ato em causa; que só pode ser impugnado como um todo;
e que a eventual invalidade da manifestação de vontade de um dos órgãos interveniente
vicia o ato no seu conjunto, implicando a invalidade do todo.
b) A
conferência de coordenação (cfr. artigo 77º/3/b) destina-se ao exercício
individualizado, mas simultâneo, das competências dos órgãos intervenientes, através
da tomada de decisões autónomas e próprias de cada órgão, que são por fim
conjugadas. Assim, concretiza a prática de um ato plural, constituído de atos
contextuais, que por serem praticados no mesmo contexto são documentados na mesma
ata (cfr. artigo 81º/3). Esta distinção, de ato plural em lugar de ato único
complexo tem diferentes implicações: que cada um dos órgãos pode anular ou
revogar o seu ato; que podem os atos ser autonomamente impugnados; e que a
eventual invalidade de um destes atos não vicia os outros.
Regime
O regime das conferências procedimentais encontra-se
delineado nos artigos 78º e seguintes. O artigo 78º consagra a regra da
necessidade da instituição das conferências procedimentais, pelo que a
realização destas exige uma previsão específica, por lei, por regulamento ou
por contrato interadministrativo a celebrar entre entidades públicas autónomas.
No âmbito da Administração direta e indireta do Estado, a instituição da conferência
procedimental pode ser feita por portaria do Ministro ou portaria conjunta dos
Ministros competentes para a direção e tutela dos organismos envolvidos (crf.
artifo 78º/2). O artigo 78º/3 acrescenta limitações ao conteúdo do ato instituidor
das conferências procedimentais.
Iniciativa
A iniciativa das conferências procedimentais pode ser
oficiosa ou resultar de requerimento de um ou mais interessados, sendo no
segundo caso a dever do órgão competente a convocação da conferência no prazo
de 15 dias (crf. artigo 79º/ 1 e 2). As seguintes alíneas do artigo 78º
continuam o tratamento da matéria de iniciativa das conferências procedimentais.
Audiência dos interessados e audiência pública
O direito de audiência dos interessados, consagrado no
artigo 121º, é exercido na conferência procedimental, oralmente, em sessão na
qual devem estar presentes todos os órgãos que nela tomam parte (cfr. artigo
80º/1). Sendo que, no caso de conferência deliberativa realiza-se uma única audiência,
reportada ao projeto de decisão respeitante ao ato complexo. Enquanto que, no
caso de conferência de coordenação, a audiência é concretizada em simultâneo
quanto às várias decisões a adotar.
Conclusão da conferência procedimental
O artigo 81º estabelece um prazo limite específico
para a conferência procedimental, que se reporta ao fim da prática ou atos que
visa preparar, ou ao termo do prazo de 60 dias, prorrogáveis por mais 30, se,
até esse momento não forem praticados os referidos atos (sendo que neste último
caso, pode a conferência ser repetida em casos excecionais, crf. artigo 81º/7).
Quando a conferência procedimental termina, o órgão que
a ela presidiu elabora uma ata, na qual são registados os sucessivos passos da
conferência, e por fim o ato final decisório. No caso das conferências deliberativas
é inscrito o ato complexo, e no caso das conferências de coordenação são inscritos
os atos contextualmente praticados por cada órgão interveniente.
No artigo 81º/4 prevê no caso de conferências deliberativas,
na falta de acordo, os órgãos intervenientes emitem uma declaração para constar
da ata, na qual fundamentam as razões da sua discordância, respeitando o dever
de fundamentação exigível à Administração Pública, conforme o disposto nas alíneas
a) e c) do artigo 152º/1.
Conclusão
Em suma, a utilização das conferências procedimentais
como mecanismo de simplificação do exercício administrativo potencializa inúmeras
vantagens das quais destaco a aceleração da emissão de uma decisão administrativa,
e o enriquecimento dessa decisão pela interligação realizada pelos vários órgãos
competentes que são deste modo chamados a discussão na mesma mesa.
Bibliografia:
ALMEIDA, Mário de Aroso, Teoria Geral do Direito Administrativo, O Novo Regime do Código de Procedimento Administrativo, 3ª Edição, Almedina, 2016, pp. 92-106
MONIZ, Ana Raquel Gonçalves, Direito Administrativo, Textos e casos práticos resolvidos, 2ª Edição, Almedina, 2015, pp. 212-214
Miriam Ferreira,
Nº de aluna: 56712
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