Neste post irei
debruçar-me sobre a temática das invalidades e dos vícios do acto
administrativo.
Em primeiro lugar
cabe identificar quais são as invalidades do acto administrativo habitualmente
tratadas pela doutrina, estas são a ilegalidade, a ilicitude e a invalidade.
O
Professor Diogo Freitas do Amaral entende por invalidade do acto administrativo,"
o valor jurídico negativo que afecta o ato administrativo em virtude da sua
inaptidão intrínseca para a produção dos efeitos jurídicos que devia
produzir".
Ou seja, se o ato não
observar requisitos de validade, este ato é inválido, e portanto pode ser
contestado perante a própria Administração, e perante os tribunais.
Ilegalidade
Durante muito
tempo considerou-se que a ilegalidade era a única fonte de invalidade,
entendia-se que todo o acto administrativo ilegal era inválido, e que todo o
acto administrativo inválido o era por ser ilegal. Actualmente essa visão já
não perdura e temos uma diferente configuração.
Por ilegalidade do acto
administrativo entede-se basicamente uma situação em que o acto administrativo
é contrario à lei.
As ilegalidades,
podem ser de natureza orgânica, formal, ou material.
A ilegalidade
do acto administrativo pode revestir várias formas, os chamados vícios do acto
administrativo - e são elas:
1. usurpação de poder (ilegalidade orgânica)
2. incompetências (ilegalidade orgânica)
3. vício de forma (ilegalidade formal)
4. violação da lei (ilegalidade material)
5. desvio de poder (ilegalidade material)
1. A usurpação
de poder consiste na ofensa, por um órgão da Administração Pública, ao
princípio da separação de poderes, através da prática de acto incluído nas
atribuições do poder judicial ou do poder administrativo.
Podemos dividir
este vício em usurpação do poder legislativo (a Administração pratica um acto
que pertence às atribuições do poder legislativo) e usurpação do poder judicial
(a Administração pratica um acto que pertence às atribuições dos Tribunais).
2. Segue-se a incompetência que consiste na prática, por um órgão da Administração, de um acto incluído nas atribuições ou nas competências de outro órgão da Administração.
Esta pode
revestir várias modalidades. São elas:
·
incompetência absoluta - quando um órgão da Administração
pratica um acto fora das atribuições da pessoa colectiva a que pertence. A incompetência
abslotuta ocorre em duas situações: quando o órgão legalmente competente para a
prática do acto pertence a uma pessoa coletiva diferente daquela a que pertence
o autor do acto, mas a uma unidade de atribuições (ministério ou secretaria
regional) diversa; e quando o poder exercido pelo órgão que praticou o acto não
é legalmente cometido a órgão algum (ou seja, é um poder que não existe na
ordem jurídica. Esta incompetência é por vezes designada como incompetência por
falta de atribuições
·
incompetência relativa - quando um órgão de uma pessoa
colectiva pública pratica um acto que está fora da sua competência, mas que
pertence à competência de outro órgão da mesma pessoa colectiva.
·
incompetência em razão da matéria - quando um órgão da Administração
invade os poderes conferidos a outro órgão da Administração em função da
natureza/matéria dos assuntos
·
incompetência em razão da hierarquia - quando há invasão de poderes conferidos a outro órgão
em função grau hierárquico, por exemplo, quando o subalterno invade a competência do superior, ou
quando o superior invade a competência própria ou exclusiva do subalterno.
·
incompetência em razão do lugar - quando um órgão da Administração
invade os poderes conferidos a outro órgão em função do território.
·
incompetência em razão do tempo - quando um órgão da Administração
exerce os seus poderes legais em relação ao passado ou em relação ao futuro; a competência tem de ser estabelecida em relação
ao presente, salvo se a lei,
excepcionalmente, o permitir.
3.Seguindo para o vício de forma que afecta os atos administrativos praticados com desrespeito
aos seus requisitos objetivos formais de legalidade. Consiste na carência de
forma legal ou formalidades essenciais e comporta três modalidades:
·
falta de formalidades anteriores à pratica do acto; exemplo:falta de
audiência prévia
·
falta de formalidades relativas à prática do acto;
·
carência de forma legal.
4.Quanto à violação
da lei este é o vício que consiste na discrepância entre o conteúdo ou
o objecto do acto e as normas jurídicas que lhe são aplicáveis. Este vício
configura uma ilegalidade de natureza material, o que significa que a
substância do acto administrativo é contrária a lei.
O vício de violação de lei produz-se quando, no exercício de poderes vinculados, a Administração decide coisa diversa do que a lei estabelece ou nada decide quando a lei manda decidir algo.
O vício de violação de lei produz-se quando, no exercício de poderes vinculados, a Administração decide coisa diversa do que a lei estabelece ou nada decide quando a lei manda decidir algo.
Comporta várias modalidades:
·
Falta de base legal para prática do acto
·
Incerteza, Ilegalidade ou Impossibilidade do conteúdo do acto
administrativo;
·
Incerteza, Ilegalidade ou Impossibilidade do objecto do acto
administrativo;
·
Inexistência ou Ilegalidade dos pressupostos relativos ao conteúdo ou ao
objecto.
·
Ilegalidade dos elementos acessórios incluídos pela Administração no
conteúdo do acto;
·
qualquer outra ilegalidade do acto administrativo insusceptível de ser
reconduzida a outro vício.
O vício de
violação de lei é também doutrinalmente empregue para garantir o carater
fechado da teoria dos vícios do ato administrativo: nestes termos, padecem de
violação de lei os atos administrativos ilegais cuja ilegalidade não se possa
reconduzir a qualquer dos outros vícios, tendo, portanto, este vício caráter
residual.
5. Por fim,
o desvio de poder consiste no exercício de um poder
discricionário por um motivo principalmente determinante que não condiga com o
fim que a lei visou ao conferir; há uma
discrepância entre o fim legal e o fim prosseguido pela administração.
O desvio de
poder é um vício funcional, ou seja, decorre da preterição de requisitos de
legalidade respeitantes ao fim e aos motivos dos atos administrativos.
As duas modalidades
do desvio de poder são:
·
o desvio de poder por motivo de interesse público (quando a
Administração visa alcançar um fim de interesse público, embora diverso daquele
que a lei impõe);
·
o desvio de poder por motivo de interesse privado (quando a
Administração não prossegue um fim de interesse público mas um fim de interesse
privado, por exemplo através da corrupção ou favorecimento de familiares)
O desvio de
poder é um vício típico dos atos praticados ao abrigo de margem de livre
decisão, pois nos atos administrativos vinculados os requisitos funcionais de
legalidade são de reduzida importância.
As situações de
desvio de poder, sobretudo doloso, são normalmente dissimuladas pelos seus
responsáveis, designadamente através da ocultação dos verdeiros motivos na
fundamentação do ato. O desvio de poder é, portanto, muito difícil de provar, o
que explica que a sua teorização, especialmente em voga nos anos quarenta e
cinquenta do século XX, assuma actualmente contornos secundários e seja em
grande parte votada ao esquecimento. Além disso, a moderna construção do
princípio da imparcialidade, muito mais objetiva e rigorosa que a clássica
teoria do desvio de poder, permite atualmente ultrapassar algumas das suas
limitações intrínsecas.
Ilicitude
Geralmente esta
coincide com a ilegalidade, ou seja, o acto é ilícito por ser ilegal. Contudo,
há casos em que um acto é ilícito sem ser ilegal: ofensa de direito absoluto do particular, violação
do contrato não administrativo, ofensa de bons costumes e ordem publica e acto
que contenha usura.
Invalidade
As Formas de
Invalidade:
São duas as consequências
que a lei determina para actos administrativos inválidos: a Nulidade e Anulabilidade (artºs 161º
e segs do CPA). Parte da doutrina admite ainda a inexistência como invalidade,
no entanto não me debruçarei
sobre a inexistência dado o Professor
Vasco Pereira da Silva com ela não concordar.
A Nulidade, expressa no artigo 161.do CPA, é para o Professor Freitas do Amaral a forma mais grave de invalidade, tendo carater excepcional e causas taxativas. Contudo, o Professor Vasco Pereira da Silva discorda, remetendo para o artigo 161º do CPA, onde esta regra da excepcionalidade não existe.
O problema justificativo que se tem colocado na doutrina portuguesa é o de
saber se o artigo 161º do CPA consiste numa enumeração taxativa ou meramente
enunciativa.
Há outros entendimentos sobre o artigo 161º, nomeadamente o do Professor
Fausto Quadros, que considera que o artigo à luz do CPA de 2015 quer fazer
renascer a figura da inexistência como uma forma de invalidade e à necessidade
de introduzir esse conceito.
A nulidade é, para o Professor Vasco Pereira da Silva, aplicada não
taxativamente às situações enumeradas no artigo, mas antes de acordo com a
maior gravidade da lesão das mesmas, sendo, por conseguinte, a anulabilidade
aplicada às situações menos graves no caso concreto.
A nulidade tem
as seguintes características:
·
o acto nulo é totalmente ineficaz desde o início, não produz qualquer
efeito;
·
a nulidade é insanável, quer pelo decurso do tempo, quer por ratificação,
reforma ou conversão;
·
os particulares e os funcionários públicos têm o direito de desobedecer a
quaisquer ordens que constem de um acto nulo;
·
se mesmo assim a Administração quiser impor pela força a execução de um
acto nulo, os particulares têm o direito de resistência passiva (Artº 21º CRP);
·
um acto nulo pode ser impugnado a todo o tempo
·
o pedido de reconhecimento da existência de uma nulidade num acto
administrativo pode ser feito junto de qualquer Tribunal, e não apenas perante
os Tribunais Administrativos (art.162º, nº2 CPA)
A declaração jurisdicional de nulidade constitui o objecto de uma ação
administrativa especial de impugnação de ato administrativo (CPTA, art.50º,
nº1). Portanto, quando se vai a tribunal impugnar um ato nulo, o que o tribunal
administrativo faz é declarar a sua nulidade.
Afirma o Professor João Caupers que “o ato nulo não produz efeitos – o que
não significa que não possa acarretar consequências; a não produção de efeitos
é uma apreciação jurídica e não uma verificação factual”, deste modo, “assiste
aos funcionários públicos confrontados com um ato nulo o direito de desobediência
e aos cidadãos, em circunstâncias idênticas, o direito fundamental de
resistência (cfr. artigo 21º da CRP)”.
A Anulabilidade
É uma forma menos grave da invalidade e tem características distintas às da nulidade (Artº 163º CPA):
·
O acto anulável, embora inválido, é juridicamente eficaz até ao
momento em que venha a ser anulado; Enquanto não for anulado, produz efeitos
jurídicos como se fosse válido
·
a anulabilidade é sanável, quer pelo decurso do tempo, quer por
ratificação, reforma ou conversão; (art.164º, nº1, do CPA). Ou seja, o ato
anulável acaba por convalidar se não for objecto de nenhuma anulação
administrativa oficiosa ou de anulação jurisdicional;
·
não é possível opor qualquer resistência à execução forçada de um
acto anulável. A execução coactiva de um acto anulável é legítima, salvo se a
respectiva eficácia for suspensa;
·
o acto anulável só pode ser impugnado dentro de um certo prazo que a lei
estabelece;
·
o pedido de anulação só pode ser feito perante um Tribunal Administrativo.
Tem legitimidade para impugnar o acto anulável o interessado na sua
anulação ou o Ministério Público dentro de um certo prazo (art.163º, nº3 e 4,
do CPA e art.58º do CPTA). Este pedido pode ser feito perante a Administração
Pública ou perante um tribunal administrativo competente.
A sentença proferida pelo tribunal sobre um ato anulável é uma sentença de
anulação ao contrário da sentença proferida sobre o ato nulo que como já visto
é meramente declarativa. Por outras palavras: o ato nulo é declarado nulo; o
ato anulável é verdadeiramente anulado.
Bibliografia:
ALMEIDA, Mário
Aroso de – TEORIA GERAL DO DIREITO ADMINISTRATIVO, 2016, 3ª edição;
AMARAL, Freitas do, Curso de Direito Administrativo – vol.II, 3ªed.,
Almedina, 2016
CAUPERS, João, Introdução ao Direito Administrativo, 10ªed., Âncora
editora, 2009
SOUSA, Marcelo
Rebelo de; MATOS, André Salgado de – Direito administrativo geral: actividade
administrativa, Tomo III, 2º Edição. Lisboa: Dom Quixote, 2009.
Vasco Pereira
da Silva, Aulas Teóricas na Regência da turma B de Direito Administrativo II
Inês Amores da Silva, 29879
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