sexta-feira, 25 de maio de 2018

As garantias dos particulares como meio de impugnação do ato administrativo


As garantias dos particulares podem ser definidas como “os meios criados pela ordem jurídica com a finalidade de evitar ou sancionar as violações do direito objetivo, as ofensas dos direitos subjetivos ou dos interesses legítimos dos particulares ou o demérito da ação administrativa, por parte da Administração Pública”, ou mais sucintamente por “os meios jurídicos de defesa dos particulares contra a Administração Pública”. Essencialmente, existem três modalidades, as garantias políticas, as garantias administrativas e as garantias contenciosas, as garantias administrativas distinguem-se por serem efetivadas através da atuação e decisão de órgãos da Administração Pública.
As garantias administrativas efetivam-se utilizando os instrumentos de controlo de mérito e de legalidade dos órgãos da Administração Pública, bem como de uma forma mista, estes instrumentos correspondem a mecanismos de controlo da sua atividade, criados por lei. As garantias de legalidade visam apreciar a ilegalidade do ato, por outro lado, as garantias de mérito visam apreciar o mérito do ato em si, tendo em conta a realidade e ponderando a sua conveniência, adequação e oportunidade.
As garantias petitórias têm na sua base um pedido dos particulares à Administração Pública, existindo ou não um ato administrativo praticado previamente que possa ser invocado, por outro lado, as garantias impugnatórias têm na sua base uma impugnação de um ato administrativo, pressupondo a existência de um ato praticado previamente. Neste post vou abordar em especial as garantias impugnatórias.
As garantias impugnatórias são garantias administrativas, em que perante um ato administrativo já praticado, os particulares tem legitimidade por lei a impugnar esse ato, isto é, a ataca-lo com determinados fundamentos, com vista à sua revogação, anulação administrativa ou modificação (Art. 184º / 1 e 2 do CPA). Estas podem ser definidas sucintamente como “os meios de impugnação de atos administrativos perante os órgãos da Administração Pública”. As principais espécies são quatro (Art. 191º a 199º do CPA): reclamação, recurso hierárquico, recurso administrativo especial, recurso tutelar.
A reclamação é “o meio de impugnação de um ato administrativo perante o seu próprio autor”. Esta garantia tem como base a circunstância de os atos administrativos poderem ser revogados, anulados ou modificados pelo órgão que os praticou. Por regra, pode reclamar-se de qualquer ato administrativo, até mesmo de uma omissão ilegal do ato (Art. 184º / 1 / b) do CPA), no entanto, não é possível reclamar do ato que decida uma anterior reclamação ou recurso administrativo, salvo com fundamento em omissão de pronúncia (Art. 191º / 2 do CPA), caso contrário todas as decisões de reclamações seriam sempre suscetíveis de novas reclamações. O regime da reclamação tem natureza facultativa, isto é, a sua não utilização não preclude o uso de outros meios de impugnação. A reclamação, quando interposta, suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal (Art. 190º / 3 do CPA). No entanto, a suspensão do prazo não impede o interessado de proceder à impugnação contenciosa do ato na pendência da impugnação administrativa nem de requerer a adoção de providências cautelares (Art. 190º / 4 do CPA). Deste modo, o legislador visa incentivar a utilização de meios de impugnação administrativa. O prazo-regra para o particular apresentar uma reclamação é de 15 dias (Art. 191 / 3 do CPA) e o prazo para o órgão competente decidir sobre a reclamação é de 30 dias (Art. 192º / 2 do CPA). Em caso de silêncio do órgão competente, segue-se o novo regime de reação contra a omissão de atos ilegais – recurso administrativo ou ação de condenação à prática do ato devido (Art. 192º / 3 do CPA).
O recurso hierárquico é “a garantia administrativa dos particulares que consiste em requerer ao superior hierárquico de um órgão subalterno a revogação ou anulação de um ato administrativo ilegal por ele praticado ou a prática de um ato ilegalmente omitido pelo mesmo”. No caso da impugnação de atos ilegais como no da reação contra a omissão ilegal de atos, o superior hierárquico pode substituir-se ao órgão subalterno, exceto se este tiver competência exclusiva, caso em que o superior hierárquico apenas pode ordenar ao subalterno a prática de atos que lhe afigurem adequados (Art. 197º do CPA). O recurso hierárquico tem sempre uma estrutura tripartida: o recorrente, é o particular que interpõe o recurso; o recorrido ou órgão a quo, o órgão subalterno de cuja decisão se recorre; o órgão decisório ou órgão ad quem, o órgão superior para quem se recorre e que deve legalmente decidir o recurso. São pressupostos do recurso hierárquico: a existência de hierarquia; que tenha sido praticado ou omitido um ato administrativo por um subalterno; e que este subalterno não goze por lei de competência exclusiva. A distinção entre recursos hierárquicos necessários e facultativos (Art. 185º / 1 do CPA) afigura-se relevante na compreensão do regime do recurso hierárquico: a regra é o recurso hierárquico facultativo (Art. 185º / 2 do CPA) “é o que respeita a um ato verticalmente definitivo, ou à omissão ilegal dele de que já cabe ação contenciosa”; a exceção é o recurso hierárquico necessário (Art. 189º e 190º do CPA), “é aquele que é indispensável para se atingir um ato verticalmente definitivo que possa ser impugnado contenciosamente”; os atos verticalmente definitivos caraterizam-se por não poderem ser diretamente impugnados ao órgão que os praticou perante os tribunais administrativos.
Quanto ao regime da interposição do recurso pelos particulares: este inicia-se com a interposição do recurso, este é “dirigido ao mais elevado superior hierárquico do autor do ato ou da omissão, se a competência para a decisão se encontrar delegada ou subdelegada” (Art. 194º / 1 do CPA), mas o recurso tem de ser apresentado ao órgão subalterno, o qual fará depois seguir para o órgão superior hierárquico, a fim de que este o aprecie e decida (Art. 194º / 2 do CPA); prazo de interposição, se o recurso hierárquico tiver por objeto a impugnação de um ato, e este tiver de ser notificado ao interessado ou interessados, “o prazo do recurso só corre a partir da data da notificação” (Art. 188º / 1 CPA). nos restantes casos, o prazo conta-se a partir da publicação, notificação ou conhecimento do ato ou da sua execução, conforme o que ocorre primeiro (Art. 188º / 2 do CPA), “quando a lei não fixe prazo diferente, é de 30 dias o prazo para a interposição do recurso hierárquico necessário” (Art. 198º / 1 do CPA), se o recurso hierárquico tiver por objeto contestar a omissão ilegal de um ato, o prazo para a respetiva interposição conta-se a partir da data do incumprimento do dever de decisão (Art. 188º / 3 do CPA).
Os recurso administrativos especiais (ou recursos hierárquicos impróprios) são os “recursos administrativos mediante os quais se impugna um ato praticado por um órgão de certa pessoa coletiva pública perante outro órgão da mesma pessoa coletiva que, não sendo superior do primeiro, exerça sobre ele poderes de supervisão”. Só existem estes recursos especiais nos casos expressamente previstos por lei (Art. 199º do CPA). A caraterística distintiva dos recurso administrativos especiais é que estes só existem caso a lei atribua poder de supervisão a um dado órgão de uma pessoa coletiva relativamente a outro órgão da mesma pessoa coletiva, e fora do âmbito de uma relação hierárquica.
O recurso tutelar, também abrangido na categoria dos recurso administrativos especiais, surge autonomizado na sua designação (Art. 199º / 3 a 5 do CPA), “é o recurso administrativo interposto de um ato ou omissão de uma pessoa coletiva autónoma, perante um órgão de outra pessoa coletiva pública que sobre ela exerça poderes de tutela ou de superintendência”. No entanto, é pressuposto da existência do recurso tutelar a sua consagração expressa na lei (Art. 199 º /1 do CPA). Por outro lado, o recurso tutelar só pode ter por fundamento a inconveniência ou a inoportunidade do ato recorrido nos casos em que a lei estabeleça uma tutela de mérito (Art. 199º / 3 do CPA). O órgão superior hierárquico, quanto à sua competência decisória, só pode modificar ou substituir o ato recorrido se a lei conferir a este poderes de tutela substitutiva (Art. 199º / 4 do CPA).

Bibliografia:

  • Amaral, Diogo Freitas do. Curso de Direito Administrativo, Volume II. Almedina, 2016 (3ª edição), Coimbra.
  • Almeida, Mário Aroso de. Teoria Geral do Direito Administrativo: O Novo Regime do Código do Procedimento Administrativo. Almedina, 2017 (4ª Edição), Coimbra.
  • Caupers, João. Introdução ao Direito Administrativo. Âncora Editora, 2013 (12ª edição), Lisboa.


Nuno Francisco
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