sexta-feira, 25 de maio de 2018

Os vícios do ato administrativo: a usurpação de poderes e a incompetência


O ato administrativo, quando padece de ilegalidade, pode revestir várias formas específicas, os chamados vícios do ato administrativo. Entre os vícios orgânicos do ato, ou seja, os vícios relacionados com os autores do mesmo, encontram-se a usurpação de poder e a incompetência.
            Prevista no artigo 162.º/2-a), CPA, a usurpação de poder é o vício que consagra a prática de um ato por um órgão administrativo quando este se enquadra nas atribuições do poder legislativo ou judicial. Neste caso, o órgão da Administração não está habilitado a praticar o ato, logo existe uma violação do princípio da separação de poderes consagrado constitucionalmente (“A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na […] separação e interdependência de poderes” – art. 2.º, CRP).
            O professor Freitas do Amaral divide a usurpação em três modalidades, sendo estas:
®    A usurpação do poder legislativo, onde o ato praticado pelo órgão administrativo pertence às atribuições do poder legislativo;
®    A usurpação do poder moderador, onde o órgão administrativo pratica um ato pertencente ao poder moderador (referente ao Presidente da República);
®    A usurpação do poder judicial, quando o órgão administrativo interfere nas atribuições do poder judicial ao praticar um ato relativo às mesmas.

A incompetência, por sua vez, é a prática de um ato administrativo por um órgão da administração sem para tal dispor de uma norma de atribuição de competência. Este vício pressupõe a invasão da esfera de competências ou atribuições de outro órgão administrativo.
Este vício pode revestir duas modalidades:
®    A incompetência absoluta, resultado de prática de um ato por um órgão administrativo fora das atribuições da pessoa coletiva a que pertence.
Segundo o professor Marcelo Rebelo de Sousa, esta modalidade da incompetência existe em três situações. Estaremos perante incompetência absoluta não só se o órgão competente para a prática do ato pertencer a uma pessoa coletiva diferente daquela onde o sujeito do ato se encontra, mas também se o órgão competente e o autor do ato pertencerem à mesma pessoa coletiva, mas possuírem atribuições diferentes. Por último, a incompetência absoluta manifesta-se quando o poder exercido pelo autor do ato vai para além das suas atribuições, mas também não pertence a um outro órgão. Neste caso, a atribuição não é legalmente atribuída a um órgão.
®    A incompetência relativa, se o ato praticado pelo órgão administrativo está fora das suas competências, mas se encontra nas competências de outro órgão da mesma pessoa coletiva que o órgão que praticou o ato viciado.

Relativamente à incompetência, o professor Freitas do Amaral utiliza quatro critérios adicionais para classificar este vício:
Ø  Matéria: a ingerência na esfera do órgão jurídico alheio é feita em natureza do assunto tratado pelo ato administrativo;
Ø  Hierarquia: o órgão administrativo que pratica o ato fá-lo através da invasão nos poderes de outro órgão hierarquicamente superior ou inferior;
Ø  Lugar: tem-se em conta o território em função do qual o ato administrativo é praticado;
Ø  Tempo: os poderes legalmente conferidos ao órgão administrativo podem estar limitados a nível temporal, assim, qualquer prática dos mesmos antes ou depois desse período de tempo, reveste a forma de incompetência do ato.


Qual a principal diferença entre estes dois vícios do ato administrativo?
Enquanto que a usurpação de poderes pressupõe a invasão da esfera de outros poderes estaduais pelo poder executivo (poder administrativo), a incompetência requer a prática de um ato por um órgão da administração que se apossa das atribuições ou competências de outra entidade administrativa. Na incompetência, a intervenção na esfera de poderes alheia não extravasa o âmbito do poder administrativo.
No entanto, alguns autores consideram que a usurpação de poderes pode abranger casos de incompetência absoluta. Nestes casos, encontram-se as pessoas coletivas públicas e as entidades privadas encarregues do exercício de poderes públicos.

Bibliografia:
o   Caupers, João: Introdução ao Direito Administrativo, 12ª edição, Âncora Editora, 2016;
o   Freitas do Amaral, Diogo: Curso de Direito Administrativo, vol. II, 3ª edição, Almedina, 2017;
o   Rebelo de Sousa, Marcelo e Salgado de Matos, André: Direito Administrativo Geral – Tomo III – Atividade administrativa, 2ª edição, Dom Quixote, 2009.

Ana Brito (56896)

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