O ato
administrativo, quando padece de ilegalidade, pode revestir várias formas
específicas, os chamados vícios do ato
administrativo. Entre os vícios orgânicos do ato, ou seja, os vícios
relacionados com os autores do mesmo, encontram-se a usurpação de poder e a incompetência.
Prevista no artigo 162.º/2-a), CPA,
a usurpação de poder é o vício que
consagra a prática de um ato por um órgão administrativo quando este se
enquadra nas atribuições do poder legislativo ou judicial. Neste caso, o órgão
da Administração não está habilitado a praticar o ato, logo existe uma violação
do princípio da separação de poderes consagrado constitucionalmente (“A República Portuguesa é um Estado de direito
democrático, baseado na […] separação e interdependência de poderes” – art.
2.º, CRP).
O professor Freitas do Amaral divide
a usurpação em três modalidades, sendo estas:
®
A usurpação
do poder legislativo, onde o ato praticado pelo órgão administrativo
pertence às atribuições do poder legislativo;
®
A usurpação
do poder moderador, onde o órgão administrativo pratica um ato pertencente
ao poder moderador (referente ao Presidente da República);
®
A usurpação
do poder judicial, quando o órgão administrativo interfere nas atribuições
do poder judicial ao praticar um ato relativo às mesmas.
A incompetência, por sua vez, é a
prática de um ato administrativo por um órgão da administração sem para tal
dispor de uma norma de atribuição de competência. Este vício pressupõe a
invasão da esfera de competências ou atribuições de outro órgão administrativo.
Este vício pode revestir duas modalidades:
®
A incompetência
absoluta, resultado de prática de um ato por um órgão administrativo fora
das atribuições da pessoa coletiva a que pertence.
Segundo o professor Marcelo
Rebelo de Sousa, esta modalidade da incompetência existe em três situações.
Estaremos perante incompetência absoluta não só se o órgão competente para a
prática do ato pertencer a uma pessoa coletiva diferente daquela onde o sujeito
do ato se encontra, mas também se o órgão competente e o autor do ato
pertencerem à mesma pessoa coletiva, mas possuírem atribuições diferentes. Por
último, a incompetência absoluta manifesta-se quando o poder exercido pelo
autor do ato vai para além das suas atribuições, mas também não pertence a um
outro órgão. Neste caso, a atribuição não é legalmente atribuída a um órgão.
®
A incompetência
relativa, se o ato praticado pelo órgão administrativo está fora das suas
competências, mas se encontra nas competências de outro órgão da mesma pessoa
coletiva que o órgão que praticou o ato viciado.
Relativamente à incompetência, o professor Freitas do Amaral utiliza quatro
critérios adicionais para classificar este vício:
Ø
Matéria: a
ingerência na esfera do órgão jurídico alheio é feita em natureza do assunto
tratado pelo ato administrativo;
Ø
Hierarquia: o órgão
administrativo que pratica o ato fá-lo através da invasão nos poderes de outro
órgão hierarquicamente superior ou inferior;
Ø
Lugar: tem-se
em conta o território em função do qual o ato administrativo é praticado;
Ø
Tempo: os
poderes legalmente conferidos ao órgão administrativo podem estar limitados a
nível temporal, assim, qualquer prática dos mesmos antes ou depois desse período
de tempo, reveste a forma de incompetência do ato.
Qual a principal diferença entre
estes dois vícios do ato administrativo?
Enquanto que a usurpação de poderes pressupõe a invasão da esfera de outros
poderes estaduais pelo poder executivo (poder administrativo), a incompetência
requer a prática de um ato por um órgão da administração que se apossa das
atribuições ou competências de outra entidade administrativa. Na incompetência,
a intervenção na esfera de poderes alheia não extravasa o âmbito do poder
administrativo.
No entanto, alguns autores consideram que a usurpação de poderes pode
abranger casos de incompetência absoluta. Nestes casos, encontram-se as pessoas
coletivas públicas e as entidades privadas encarregues do exercício de poderes
públicos.
Bibliografia:
o
Caupers, João:
Introdução ao Direito Administrativo,
12ª edição, Âncora Editora, 2016;
o
Freitas do
Amaral, Diogo: Curso de Direito
Administrativo, vol. II, 3ª edição, Almedina, 2017;
o
Rebelo de
Sousa, Marcelo e Salgado de Matos, André: Direito
Administrativo Geral – Tomo III – Atividade administrativa, 2ª edição, Dom
Quixote, 2009.
Ana Brito (56896)
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